segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Coragem de questionar-se.



“Pensar é afervorar o desejo de sabedoria da realidade é inflamar-se por ela. Isto significa “ ir em direção as coisas em si mesmas”, aproximar-se delas, ficar junto e sugar o seu sentido, o seu sabor”

(Arcângelo Buzzi)

É preciso ter coragem para se aventurar no processo de leitura da realidade. Às vezes, se torna uma tarefa dolorosa desprender-se de si e caminhar ao encontro do outro, do mundo e de Deus vencendo o “ensimesmamento” e o individualismo, posturas tão comuns em nosso tempo. Só conseguimos conhecer parcialmente a realidade na relação, vamos construindo a consciência sobre ela, através da prática e da reflexão sobre esta prática num processo “autopoiético”, como uma criança que vai se relacionando com o mundo, se conhecendo e a ele.

No pensamento teológico as coisas se dão dessa maneira: vamos construindo a teologia e nos construindo juntos, nos deixando tocar pela realidade e a tocando numa relação bem intíma. Conseguimos fazer teologia bem quando percebemos que estamos em constante construção, em aprendizagem permanente sempre se aprofundando no mistério e na realidade. Tendo em mente sempre este horizonte fica mais fácil não cairmos em duas posturas reducionistas: a primeira nos estagnar em um absolutismo, tendo o conteúdo recebido como a verdade ultima e universal, perdendo-se em rubricas, legislações, sendo fixista, reduzindo a realidade, enquadrando-a em nossas normas, ou impondo sobre ela um idealismo, seria isso um absolutismo anacrônico e alienante. A segunda postura seria assumir um relativismo barato, uma tendência a sempre acolher “a novidade”, sem questioná-la e sem perceber suas possíveis conseqüências, o que de certa forma se caracteriza como um “modismo”, essa ou aquela tendência que está na moda.

O sensato seria apelar para o equilíbrio, perceber o que é essencial e deve ser mantido, deixar-se constantemente questionar-se pela realidade. Através de uma ação refletida que anseia mudança pode-se propor um objetivo, sendo consciente do que queremos atingir com a conduta adotada.

A realidade não é fixa e absoluta está em movimento, sempre muda, climaticamente, as mentalidades, e nós também vamos agindo e influindo sobre ela. Por isso, temos que estar sempre a escutá-la o que sabíamos ontem sobre ela pode não ser o que iremos ver ou ouvir hoje. Ela se apresenta complexa, diversa, pluriforme e nós homens e mulheres de fé somos chamados a dar uma resposta criativa que ilumine a realidade.

As tecnologias, os meios de exploração, as injustiças sociais, a violência institucionalizada, os processos econômicos, a depredação do meio ambiente, as pessoas tratadas como objeto descartável exige de nós uma resposta a partir da fé cristã.

O que temos a dizer sobre a realidade? Temos que fazer uma síntese de nossos valores questionados por essa realidade. Como falamos de Ressurreição e vida frente à realidade de morte? E a boa noticia?

O chão onde pisamos é muito importante para entender o que nossos olhos vêem. A nossa reflexão depende de que lugar estamos vendo o mundo. Qual o rosto de Deus que emerge no século XXI para nós teólogos e teólogas latino-americanos? Certamente a realidade não é mesma das décadas de 60, 70 e 80 e conseqüentemente a resposta não deve ser a mesma. Muitos abriram caminhos na reflexão deram respostas, talvez elas nos ajudem a enfrentar os nossos desafios. As perguntas se lançam aqui e agora. Nossa prática caminha junto com nossa reflexão? Somos “teólogos orgânicos?” Construímos teologia com o nosso povo a partir da realidade ou repetimos uma teologia de escritório elaborada distante de nós.

Pensar e repensar a nossa práxis é a nossa missão cotidiana. Os desafios são muitos, é preciso alargar os horizontes, navegar para as águas mais profundas sem medo. Tarefa urgente é repensar nossos conceitos, rever. A realidade nos convoca! Coragem e ousadia, são precisas. Nos sentimos desafiados a recomeçar sempre?“ Se não houver frutos valeu a beleza das flores. Se não houver flores valeu a sombra das folhas. Se não houver folhas valeu a intenção das sementes” È preciso começar: lançar as redes, semear e caminhar.

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